Dois e dois e dois ao longo da avenida

Significado do Número 2Desço do ônibus e respiro fundo para embalar o passo na descida da avenida. O trânsito está intenso, mas não tem ninguém parado. Todo mundo louco pra chegar logo em casa e descansar de mais um dia de trabalho, estudo...
As calçadas estão superlotadas de sacos de lixo. Alguns fechadinhos, ou dentro de gaiolas gradeadas. Outros rasgados, abertos, revirados...

Eu sempre tendo a olhar para as árvores, para o céu, observar as pessoas. Olhar onde piso não é fácil pra mim. Mas, nessas noites quentes e nessas ruas sujas, o medo, ou melhor dizendo, o pavor de baratas me obriga a andar olhando para o chão.

Eis que entre o odor da fumaça dos carros e do lixo abundante a cada 10 ou 15 passos, encontro um canteiro cheio de flores coloridas... Com um perfume delicioso.
Em seguida, mais um canteiro cheio de florzinhas brancas, contrastando com as folhas verde escuro. E ao lado, no jardim de um prédio, uma fonte. O barulhinho da água é tão agradável, relaxante.

Atravesso a rua e ainda no meio da faixa, vejo um cachorro branco deitado com as pernas estendidas, daquele jeito que todo cachorro gosta de dormir, sabe? De lado? Sempre que vejo a minha cachorra assim, tento fazer o mesmo. Não consigo fazer a posição certinha, mas é relaxante...
Enfim, vejo esse cachorro branco deitado e me dá uma sensação ruim, como se ele estivesse morto, jogado ali ao lado de muitos sacos de lixo.
Mas não, bem ao lado dele, na mesmíssima posição, tem um homem de boné. Ambos dormem. Juntos, quase em "conchinha". Fiquei comovida. Talvez um misto de tristeza por eles ali, tão expostos, e ao mesmo tempo, juntos. A cena me confortou de uma maneira meio amarga.
Estranho, absurdo até dizer isso sobre um homem e um cachorro que estão na rua, em meio ao lixo, dormindo juntos. Mas foi o que senti.

Em seguida, distraída, me deparo com o tal "monstro" que eu previa encontrar na calçada. Uma barata horrorosa. Desvio correndo e batendo o pé e retomo o meu passo apressado, sempre procurando olhar onde estou pisando.

Mas novamente uma montanha de sacos de lixo do outro lado da rua me chama a atenção. De novo, duas pessoas chafurdando nos sacos. Um casal. Eles pareciam estar num supermercado, passando de "prateleira em prateleira" (de saco em saco) em busca de algo bom: alimento, roupa, qualquer utensílio que possa ser aproveitado.

Nem bem termino de passar por eles e ouço um papo animado, alto, logo a minha frente. Dois homens de uns 40 anos, mais ou menos, estavam sentados na calçada, em cima de uma cobertinha bem cinzenta e puída, conversando e rindo. Se tivesse uma mesinha e uma cerveja, eu diria que eram dois amigos que sairam pra tomar "uma" depois da labuta. Talvez seja esse o caso... dois mendigos, ou desempregados, relaxando depois de um longo dia de andanças e de dificuldades. Mas o mais legal é que eles estavam rindo bastante, se divertindo com a conversa.

De dois em dois em dois, cheguei em casa. Pensando que a dois, parece ser mais fácil. Será?

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